Para delegado, a criatividade e a tecnologia são fundamentais para que a Polícia Civil mantenha o seu foco principal, a investigaçãoHá quatro anos responsável pela Seccional do Litoral Norte, o delegado Múcio Matos Monteiro de Alvarenga, 50 anos, acredita que o resultado dos trabalhos realizados pela Polícia Civil na região tem sido satisfatório. Com 27 anos de atuação na polícia, sendo cinco como investigador e 22 anos na função de delegado, ele também considera boa atual estrutura material do setor. Apesar disso, destaca que um dos principais problemas enfrentados é a falta de mão de obra qualificada para ocupar as vagas existentes na polícia local.O delegado reside em São Sebastião há duas décadas, desde quando foi transferido para trabalhar em Boiçucanga, Costa Sul da cidade. De lá pra cá, atuou na capital paulista e também em outros distritos policiais sebastianenses, até assumir a chefia da Seccional. Para ele, o trabalho da Polícia Civil precisa estar atrelado não somente à criatividade, mas também aos recursos tecnológicos, a fim de que o principal objetivo seja mantido: a boa e velha investigação. Em entrevista exclusiva ao Imprensa Livre, ele apontou mais sobre os altos e baixos da Polícia Civil no Litoral Norte. Imprensa Livre (IL) – Como responsável pela Delegacia Seccional, como o senhor vê o trabalho realizado pela Polícia Civil na região? Múcio Alvarenga (MA) –Eu acho que vai bem. Acredito no Litoral Norte e a polícia é da sociedade. Aqui no Litoral Norte a sociedade se interessa e se organiza para cobrar da polícia, assim investigaçãocomo contribuir. Não acredito que a polícia seja o carro chefe, mas sim um parasita da sociedade. Ela vive da sociedade e para a sociedade. Tem essa coisa cultural daqui, que é o bairrismo, mas que acaba ajudando as pessoas a cuidarem das suas comunidades. Hoje nós temos um sistema de segurança. Podemos comparar a segurança como uma cebola. Cada camada seria como um sistema de proteção, até chegar no miolo, que seria o cidadão. Se a rede de proteção funcionar bem, a pessoa estará mais segura, protegida. Isso significa que não há necessidade de se ter uma base da polícia em cada bairro, mas que a polícia esteja integrada e pronta para agir em caso de necessidade. É como casos que já ocorreram, onde um crime aconteceu em Ilhabela, e o responsável foi pego logo depois, em Ubatuba. IL – Então o senhor acredita que a ação popular contribui de fato com a polícia no Litoral Norte?MA – Sem dúvida. Aqui tudo funciona melhor, por conta desse apoio e participação popular. Não só a polícia que é assim, mas os outros setores também. A cobrança faz a diferença nos resultados. A população aqui ajuda até com as informações para a polícia, no processo de investigação. É uma realidade do Litoral Norte em geral. Essa informação chega de forma diferenciada. Eu incentivo nas reuniões que participo que as pessoas vão até a delegacia, saber quem é o delegado. Se tiver uma denúncia, que conte e depois possa cobrar as ações efetivas da polícia. Se for até o delegado responresponsável pela cidade e ele não resolver, que a pessoa venha até a seccional. A polícia, educação, saúde, é igual em todo o lugar, mas quando se cobra de forma adequada, a situação torna-se melhor. IL – Em sua opinião, a população do Litoral Norte vive hoje um sentimento de segurança?MA – Acho que sim. Vejo gente andando em lugares perigosos a noite, como em beira de pista. Nós não temos uma região onde se dá medo de andar. É diferente com outros lugares. Talvez eu vá na Rocinha, no Rio de Janeiro, e sinta medo lá. Isso não acontece aqui. Eu não tenho vitima de homicídio que estava simplesmente passando na rua e foi morto. IL – Mas o que o senhor diz a respeito dos índices divulgados de tempos em tempos sobre a segurança pública?MA – Considero esses índices cruéis para nós. A população flutuante não existe nos índices. Nós não somos São Paulo. Há fatos que as vezes são noticiados e dão impressão de que o problema de falta de segurança é grave, quando na verdade, se avaliarmos o crime perceberemos que trata-se de algo isolado, que não é uma realidade local. Todos nossos índices tiveram queda. Um exemplo seria Ilhabela: se não há nenhum caso de homicídio num ano e no outro acontece um caso, isso representa 100% de aumento. Quando os dados são divulgados a população fica com medo. Para se ter uma ideia, enquanto no Brasil fala-se em apenas 3% dos homicídios esclarecidos em 2011, aqui nós tivemos 52,3% dos casos de Ubatuba esclarecidos, assim como 83,3% de Ilhabela, 32,5% de Caraguatatuba e 46,6% de São Sebastião. IL – Podemos associar esses números aos números populacionais de cada cidade?MA – Um dado interessante é que dos 43 homicídios ocorridos em Caraguatatuba, 42 tinham antecedências criminais. Então estudando o assunto, percebemos que o que falta para esclarecer os crimes são informações. Isso porque as pessoas não contam nada, uma vez que muitos dos envolvidos têm problema e poderia criar riscos à comunidade. Se não trabalhar com a educação do povo, ensinar sobre cidadania, nada vai mudar e os casos continuarão do mesmo jeito. IL – O senhor considera a estrutura da Polícia Civil suficiente?MA – Não. IL – Mas está muito longe do ideal?MA – Sim. A Polícia Civil está passando por um momento em sua história de renovação. Falta mão de obra em todos os setores. Em contrapartida, na questão de meios e recursos de trabalho, ou seja, estrutura física a situação nunca esteve tão boa. Condições para reforma de estrutura, viaturas, computadores e outros recursos tecnológicos nós temos. O que falta são profissionais. Precisa haver mais concursos que preencham as vagas por aqui. Foi pensada numa solução e regionalizar os concursos, pois ninguém de fora queria trabalhar no Litoral Norte, mas acabou não dando certo, pois acabou não tendo aprovados. Falta um preparo, um curso que ajude as pessoas a serem aprovadas. Sobra vaga por aqui e o custo de vida é alto, então as pessoas não querem mudar para cá. IL – Daria para pontuarmos o maior desafio da Polícia Civil no Litoral Norte?MA – Hoje é trazer gente para cá, encontrar pessoas com esse desejo de trabalhar na policia daqui, pois essas sim estariam comprometidas com a cidade, com o bairro. Nosso desafio hoje é esse. IL – Nesses quatro anos que o senhor está a frente da Seccional teve algum caso em especial que poderia ser destacado?MA – Eu não posso falar isso. O trabalho da Polícia Civil não é ostensivo. A Polícia Federal cumpre dez mandatos de prisão e coloca na Rede Globo. A gente fechou quase 28, numa ação conjunta em Ilhabela e não fizemos todo esse oba-oba. Foi uma operação para pegar a espinha do tráfico no litoral. Nós sempre temos alguma ação de grande envergadura. Nunca para. Só que é com bisturi e ela nunca termina, pois dá ligação a outra. O crime contra a vida sempre recebe bastante atenção. IL – Como que é o relacionamento entre a Polícia Civil e Militar? Há alguma divergência?MA – Quem tem que saber que são duas polícias, somos nós. Eu nunca tive qualquer problema com a instituição. Pode haver problema com um policial ou outro, mas nunca com a Polícia Militar. É bem harmônico nosso relacionamento. O mesmo deve acontecer com a Guarda Municipal, Polícia Rodoviária, até com o diretor de escola. Se eu estou aqui tranquilo, é porque acreditamos que tem algum policial militar com a viatura passando pelos bairros. Exemplo disso foi a operação em Ilhabela, onde as duas policias trabalharam juntas no combate contra o tráfico. Nós precisamos das informações da Polícia Militar. Se alguém perguntar sobre a diferença entre a Militar e a Civil, eu costumo dizer que a Militar é a espada e a Civil o bisturi. Quando dá para ir com a espada, você vai. Quando não dá, vai com o bisturi, naquela coisa cirúrgica, delicada, mas aprimorada. Tem que ter os dois. IL – O horário é algo complicado para quem trabalha na Polícia Civil?MA – O horário não existe. Aqui quando você chega, vendo o horário para o estado, não tem mais jeito. Tudo é já, agora. Acontece de tudo e temos que agir para preservar a vida, evitar a violência, a destruição do patrimônio. IL – Para finalizar, gostaria que o senhor falasse um pouco das metas da Polícia, do que espera para o futuro da instituição no Litoral Norte.MA – A investigação é o que eu espero. A Polícia Civil é isso: investigação. É essa a sua vocação e ela precisa. Que esteja no seu devido lugar, organizada e cumprindo sempre o seu papel. Algo que não é qualquer um que faz. Demanda além de conhecimento e do direito, que é o corredor que delimita as ações. É preciso estar atento as inovações de telefonia, informática e outros avanços que ajudam nesse processo. Você não para. Seis meses parado na policia atual, você vira um dinossauro. Hoje a polícia está procurando seu eixo, o qual nunca deveria ter saído dele, que é a investigação.
Fonte: Jornal Imprensa Livre
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